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Experimental | 39'Por que fazer um filme com o filme?
Acredito que toda obra parte de uma inquietação, e comigo não foi diferente. Não é inspiração ou criatividade, mas um incômodo. Recentemente, o filme Deadpool & Wolverine (2024), de Shawn Levy, estreou nos cinemas. Antes disso, o TikTok já estava cheio de especulações e análises dos trailers. Quando o filme foi lançado, evitei sinopses e as críticas, exceto por alguns fragmentos e um trailer que surgiram na plataforma.
Nesse momento, estava observando e explorando como os usuários vem consumindo cinema nas redes sociais, principalmente compartilhando filmes via Google Drive, vídeos que resumem filmes em 60 segundos e até mesmo são comprimidos e acelerados no TikTok para serem assistidos na velocidade reduzida, como o exemplo de A Viagem de Chihiro (2001) publicada pelo perfil @telona.colorida¹
¹ (acessado em 12 Out 2024).
Comecei a pesquisar algumas informações sobre o Deadpool & Wolverine, e logo minha linha do tempo já estava trazendo novos vídeos sobre o tema. Comecei a coletar esses spoilers e, em cerca de 2 horas, gravei a tela do computador com os vídeos que encontrei. No CapCut, editei o material em uma versão de 15 minutos que parecia fazer sentido. Depois de mostrar a algumas pessoas, recebi alguns feedbacks de gravar diretamente do TikTok, no celular, e captar melhor a experiência da plataforma. Então, com o celular, gravei 4 horas de conteúdo, mas o arquivo corrompeu no processo.
Quase desistindo, tentei mais uma vez. Durante o processo, notei que mais vídeos haviam sido publicados, com cenas mais longas e registros feitos principalmente por espectadores da América Latina, Oriente Médio e Ásia. Desta vez, a busca foi mais limpa e específica, totalizando 1h e 24 minutos de registros da tela, muito provavelmente pela exaustam e também por já ter me habituado com o processo e também algumas hashtags mais efetivas. A estratégia para continuar esse processo foi também usar outro software, o Adobe Premiere Pro.
Ele não só facilitou a edição, como também a organização da obra em si. Dentro do editor, pude organizar os trechos recortados em cores, o que facilitou a criação de uma “ordem lógica” dos eventos, o que antes era intuitivo, acabou se tornando um “modo”, e que diferente das tentativas anteriores, possibilitou que o máximo possível de cenas fossem usadas, sem criar continuações nonsense entre elas, por mais que fossem diferentes, não apesar no conteúdo visual, mas também gravadas em diferentes salas de cinema pelo mundo, o que curiosamente também acrescentava uma composição sonora interessante, misturando muitas vezes sequências em inglês, em seguida em indiano, então espanhol.
Além disso, a hierarquia espacial na ferramenta também tornou fácil separar “momentos” de cada trecho. Dividi o filme em três atos a partir dos recortes: o primeiro é a busca de Deadpool por Wolverine; o segundo, o encontro com a nêmesis e aliados; e o terceiro, a jornada solo de Deadpool e Wolverine. Usei elementos visuais, como o número de tiros no uniforme de Logan, para marcar esses momentos.
Outro ponto importante na montagem foram as próprias intervenções dos usuários nos vídeos. Alguns deles traziam cenas do meio e final do filme, ou recortes específicos do final, mas haviam alguns apontamentos textuais indicando se tratar de um plot twist e mesmo de um spoiler do final do filme.
No total, foram cerca de 40 minutos de trechos organizados no filme experimental "deadpoolwolverineetiktok", uma exploração do consumo imediato de narrativas fragmentadas e a capacidade de ressignificá-las a partir da visão de outros. O projeto também abriu a possibilidade de fazer o mesmo com outras obras, esse ato de remixar algo “não tão desconhecido”. Entendi também que essa coleção de recortes ilustra um “fazer coletivo” não intencional, onde cada espectador acaba se tornando participante do processo ao gravar e compartilhar fragmentos nas redes sociais, criando de forma espontânea, uma nova versão do filme. O interessante é que esse “fazer coletivo” transforma a experiência cinematográfica individual em uma coletiva, mesmo a partir de fragmentos subjetivos. Cada participante adiciona algo à narrativa maior ao escolher qual parte do filme merece ser gravada e compartilhada, expandindo o filme além da sala de exibição.